Ao G1, eles explicaram por que não continuaram atuando nos Jogos.
Desorganização, restrição a protestos e grosseria de chefes foram citados.

O comparecimento dos voluntários que se ofereceram para trabalhar na Rio 2016 é de aproximadamente 70%. O comitê Rio 2016 afirma que o número é suficiente para atender bem o público e que não sabe o motivo das desistências.

Ao G1, porém, três deles explicaram por que não continuaram trabalhando na Olimpíada e relataram decepções. Os motivos citados são desorganização, revolta com as restrições políticas e até grosserias por parte de chefes de delegações. 

Uma professora portuguesa achou que teria o sonho realizado ao participar da Olimpíada Rio 2016. Em um relato enviado ao G1, a voluntária conta que as coisas não saíram como previsto e, por isso, ela teve de arcar com um prejuízo de US$ 6 mil com a vinda para o Rio.

Ao se inscrever como voluntária, tinha o objetivo adquirir mais conhecimento e experiência na área em que é formada: organização de eventos desportivos. A professora, que preferiu não ser identificar, contou que foi selecionada para atuar na área de tecnologia no Maracanã.

Apesar de não ser da área, aceitou e compareceu ao seu posto no primeiro dia. "Não recebi quase apoio nem indicações de ninguém. No segundo dia, após chegar e não ter ninguém na sala, disseram para irmos embora porque não havia nada para fazer", disse.

A professora procurou um responsável e comentou que sabia falar inglês, espanhol e um pouco de francês, por isso também gostaria de trabalhar da área de protocolo. Ela acabou sendo aceita no setor de relações internacionais e protocolo. Mas pediram que aguardasse a sua nova escala, que a voluntária afirma não ter recebido até deixar o Brasil.

Ela diz também que procurou a comissão dos voluntários para saber se iria receber o certificado, mas disseram que só isso só seria possível se toda escala tivesse sido cumprida.

"Eu cumpri o que me deixaram cumprir. Seja como for, nem que por três dias, eu fui voluntária nos Jogos Olímpicos Rio 2016", desabafou. A portuguesa, que teve de pedir licença não remunerada do trabalho, conta que se sente envergonhada pela situação que viveu: "Acabou por ser um pesadelo tudo isto".

A Rio 2016 explicou que a equipe entrou em contato com a professora para repassar a nova escala. No entanto, ela não poderá cumprir por motivos pessoais. O representante confirmou também que ela receberá o certificado por ter atuado na área de tecnologia.

Tradutora diz ter ouvido gritos
Uma tradutora carioca, que pediu para não ser identificada, também afirmar ter se decepcionado. Selecionada para ficar na área de protocolo e relações internacionais, ela conta que trabalhava diretamente com presidentes e membros de comitês olímpicos de vários países, ajudando-os em sua rotina. Mas a forma como foi tratada por eles a fez desistir de continuar na Olimpíada.

Ela explicou que os voluntários alocados nessa área precisavam resolver até problemas como acesso à internet com smartphones. Além disso, ajudavam a se comunicar com os motoristas, que não falavam inglês. "A gente era responsável pelo agendamento de carro e  eles nos culpavam até pelo atraso dos motoristas", afirmou.

A tradutora revelou que o presidente do comitê olímpico de um país europeu chegou a dizer, aos gritos, que ela era uma "péssima assistente". "Deixamos ele no Parque Olímpico e marcamos para voltar em meia hora. Dois minutos depois, ele gritou porque queria o carro, e não estava lá", relembrou.

"No treinamento, diziam que nós erámos os mais importantes por trabalhar diretamente com presidentes e membros dos comitês. Mas eles nos tratavam como se estivessémos ali para servir. Gritavam se as coisas não saíssem do jeito que queriam", disse ela.

A tradutora citou que não teve direito a intervalo para o almoço. Disse ainda que uma outra voluntária ficou 12 horas à disposição do membro de um comitê. "Ela ficou no estacionamento com o motorista, sem comer", acrescentou, explicando que não procurou o comitê para relatar o caso.

"Foi bom, porque tive uma visão de dentro da Olimpíada, de como as coisas funcionam. Eu estava doando meu tempo, mas eles não tiveram a mínima consideração comigo."

A Rio 2016 disse ao G1 que não chegou à organização nenhuma reclamação formal sobre o tratamento dos membros dos países com os voluntários.

'Desisti por um ideal'
Já Luis Moreira, de 25 anos, desistiu antes mesmo de seu primeiro dia de trabalho como voluntário na Olimpíada. A retirada de um homem protestando durante um jogo o desmotivou a participar do evento.

“Estava em um social com os amigos e vi o vídeo de um pai de família sendo retirado. Eu fiquei com aquilo na cabeça. No dia seguinte, quando fui me vestir, coloquei o uniforme e repensei se deveria ir", lembrou.

"Como estudante de comunicação social, a gente estuda sobre a liberdade de expressão e aprendi a valorizar isso. Desisti de um sonho para defender um ideal. Eu desisti antes que tivesse que fazer alguma coisa como essa”.

Depois que Moreira desistiu da Rio 2016, uma decisão judicial garantiu as manifestações dentro de estádios do evento.

Escalado para trabalhar no Parque Olímpico, na Arena de tênis, no horário de 15h a 0h, o universitário contou que sua motivação para se inscrever como voluntário foi a experiência e a oportunidade de conhecer novas pessoas.

Ele tentou entrar em contato com o Comitê para informar sua desistência, mas até sexta-feira (12) ele não tinha obtido retorno. “Entrei em contato por telefone, mas só dava ocupado”, afirmou. A preocupação agora é devolver o uniforme que ganhou da organização: "Não quero ficar com o uniforme porque eu não mereço. Se eles não responderem o email, quero doar".

Rio 2016: 'Há o compromisso, mas não há uma obrigação'
A Rio 2016 comunicou que o programa de voluntário está dentro da expectativa em relação às faltas e as adesões. A organização explicou também que trabalha com "realocação em caso de eventuais faltas de voluntários em alguma área".

Os responsáveis informaram ainda que não sabem o motivo por que as pessoas desistem e que, como são voluntários, não têm obrigação de comparecimento: "Há o compromisso, mas não há uma obrigação".